Em primeiro lugar, gostaria de lembrar que toda (boa) comédia é um procedimento de dissolução do que é sagrado ou substancial. Ruy Fausto pontua muito bem, nesse sentido, como os árabes na França incompreenderam a importância da sátira a Maomé feita pelo Charlie Hebdo: rir dos símbolos religiosos muçulmanos não era "preconceito", mas sim o próprio modo da sociedade ocidental de "profanizar" o islamismo, de torná-lo corrente no dia a dia francês, de igualá-lo às outras religiões ocidentais que também são constantemente alvo de sátiras, em suma, um certo modo de inclusão do islamismo na vida francesa. Regimes totalitários, instituições sagradas etc. não aceitam o riso; são sociedades sérias.
O ponto central das comédias dos Farrelly é a tentativa de subverter o clichê, a posição e a solução costumeira das imagens hollywoodianas, por meio de uma canalização (muito consciente, diga-se de passagem), do mau gosto, da imbecilidade, da tosqueira.
Filmografia essencial dos irmãos Farrelly:
1) Debi & Lóide [Dumb & Dumber], 1994
2) Quem Vai Ficar com Marry? [There's Something About Mary], 1998
3) O Amor é Cego [Shallow Hal], 2001
4) Ligado em Você [Stuck on You], 2003
5) Antes Só do que Mal Casado [The Heartbreak Kid], 2007